Reforma tributária: o que significaria para o Brasil ter maior IVA do mundo
A reforma tributária, debatida há décadas nunca esteve tão perto de se tornar realidade. Defensores dizem que a proposta vai simplificar
a cobrança de tributos e impulsionar o crescimento econômico. Críticos, porém, reclamam que a mudança
vai criar o maior imposto sobre consumo do mundo. Já especialistas ouvidos pela BBC News Brasil
dizem que as duas coisas podem andar juntas. Na verdade, ainda não se sabe qual vai ser
a alíquota do Imposto sobre Valor Agregado, O IVA, nome do novo tributo a ser criado caso
a reforma de fato seja implementada. Mas é dado como certo que será uma das mais
altas do planeta. No entanto, mesmo que a alíquota seja recorde,
o novo sistema deve trazer muitos impactos Positivos para a economia, segundo especialistas. Eu sou Mariana Schreiber, repórter da BBC
News Brasil em Brasília, e nesse vídeo te Explico o que é a reforma tributária, por
que vai criar um imposto tão alto e como, Ainda assim, deverá ser capaz de impulsionar
o crescimento do país, na avaliação de especialistas. Então vamos lá, o que é a reforma tributária? A reforma tributária, apoiada pelo governo
de Luiz Inácio Lula da Silva, pretende acabar Com cinco impostos que hoje são cobrados
sobre o consumo de bens e serviços no país. O IPI, PIS e Cofins, que são impostos federais;
o ICMS, que é cobrado pelos Estados; e o ISS, cobrado por municípios. A ideia é que todos sejam substituídos por
um Imposto sobre Valor Agregado, o chamado IVA, modelo de tributação sobre consumo
mais adotado no mundo. Hoje, mais de 170 países já usam esse sistema. No caso brasileiro, o IVA terá dois componentes. A Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS),
que substituirá os três impostos federais. E o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS),
que unificará os tributos cobrados por Estados e municípios. A promessa é que o novo modelo será muito
mais simples que o atual, reduzindo gastos De empresas com burocracia e também diminuindo
as disputas judiciais entre governo e contribuintes. O Congresso ainda terá
que aprovar em 2024 a regulamentação da Reforma, com detalhes sobre como o novo sistema
vai funcionar de fato. Depois disso, a ideia é que o IVA seja implementado
gradualmente no país, substituindo aos poucos Os atuais impostos a partir de 2026. A previsão é que o novo tributo só estará
plenamente em funcionamento em 2033. Agora vamos entender por que o IVA brasileiro
será um dos mais altos do mundo. Ainda não se sabe qual será a alíquota
exata do novo imposto. Isso vai depender do texto final aprovado
e da regulamentação da reforma. Segundo projeções preliminares do Ministério
da Fazenda, o IVA brasileiro pode ficar entre
25,45% e 27%, mas esse cálculo será revisto
após a aprovação do texto no Senado, devido às alterações na proposta adotadas pelos
senadores. Já uma projeção do pesquisador do Ipea
João Maria Oliveira, também anterior à Aprovação no Senado, calculou que o IVA
brasileiro poderia chegar a 28,4%. Hoje, o maior IVA do mundo é o da Hungria,
de 27%. Já os países da Organização para Cooperação
e Desenvolvimento Econômico, a OCDE, têm Alíquota média de 19,2%. Dos 38 integrantes da organização, formada
principalmente por países ricos, apenas os Estados Unidos não adotam o IVA. A possibilidade de o novo imposto brasileiro
ser o maior do planeta tem provocado fortes Críticas da oposição. O ex-ministro do presidente Jair Bolsonaro
e hoje senador Rogério Marinho, do PL, tem Insistido nesse ponto em várias declarações. Na rede social X, por exemplo, ele postou
o seguinte, logo após o Senado aprovar a Reforma: É inaceitável uma reforma tributária que
nos impõe o maior IVA do mundo, ameaça investimentos, Competitividade, e pressiona custos que recairão
sobre todos nós! Mas por que a alíquota brasileira será tão
alta? Defensores da proposta dizem que o objetivo
da reforma tributária não é reduzir a arrecadação De impostos no Brasil. A ideia é que municípios, Estados e União
continuem recolhendo a mesma quantia com o IBS e o CBS que recolhem hoje com os cinco
impostos que deixarão de existir. O objetivo de manter a mesma arrecadação
é não desfalcar o caixa dos governos, já Que esse dinheiro é usado para bancar serviços
públicos, como escolas, hospitais e o funcionamento das polícias. Ou seja, a alíquota do novo imposto será
equivalente ao que já se arrecada hoje, me Explicou a consultora internacional especialista
em IVA Melina Rocha. A explicação é que a reforma vai ser neutra
em termos de não diminuir a arrecadação E não aumentar a carga tributária. Então, sendo neutra, isso quer dizer que
os novos tributos, eles têm que arrecadar Exatamente a mesma coisa que (os governos)
arrecadam hoje com os atuais tributos, né, Tanto na esfera Federal quando na esfera Estadual
e Municipal. Então, quando a gente troca um tributo pelo
outro e a arrecadação tem que ser a mesma, O IBS e o CBS vão ser calibrados de forma
manter a carga tributária atual. Então, a gente já tem essa maior IVA do
mundo, né?
Isso quer dizer que o Brasil tem impostos
mais altos que em outros países? Depende do tipo de imposto, ressalta Melina
Rocha. No caso da tributação do consumo, de fato
o Brasil tem impostos mais elevados do que A média mundial. É por isso que o IVA brasileiro caminha para
ser um dos mais altos do mundo. Por outro lado, o Brasil tributa menos propriedade
e renda que outros países. Com isso, considerando o total de impostos
arrecadados, o Brasil tem uma carga tributária Menor que a média dos países da OCDE. Vejamos os números de 2020 compilados em
um relatório da Receita Federal. Enquanto a carga tributária média dos países
da OCDE estava em de 33,5% do Produto Interno Bruto naquele ano, a brasileira era de 30,9%
do PIB. Ao analisar o tipo de tributo, o relatório
mostra que a carga tributária sobre renda No Brasil era de 6,9% do PIB, contra 10,6%
na média da OCDE. Por outro lado, no caso da tributação sobre
bens e consumos, o cenário se inverte: a Carga brasileira estava em 13,5% do PIB, contra
10,8% na média da OCDE. Bom, eu te expliquei que o IVA brasileiro
vai ser alto porque a tributação do consumo No Brasil já é elevada hoje. Mas ainda tem outros dois fatores que vão
impactar a alíquota do novo imposto. Um deles são os descontos que estão sendo
dados na reforma a alguns setores. Serviços de saúde e educação, por exemplo,
pagarão um IVA equivalente a 40% da alíquota cheia. Já a cesta básica terá alguns itens com
isenção total e alguns itens com alíquota Reduzida, de 40% da alíquota cheia. Há ainda segmentos que terão desconto, mas
que a alíquota ainda será definida na regulamentação Da reforma, como serviços de hotelaria, parques
de diversão e bares. No total, foram incluídas 42 previsões de descontos no novo tributo na Reforma Tributária aprovada no Senado e na Câmara até o momento. O número é considerado alto por especialistas
e pelo próprio governo, mas há uma avaliação De que não seria possível aprovar a reforma
no Congresso sem atender a pressão de setores Econômicos por esses descontos. O problema disso é que, para que alguns produtos
e serviços tenham imposto menor, a alíquota Padrão capaz de garantir a mesma carga tributária
de hoje precisa ser maior. Por outro lado, tem um fator que pode baixar
um pouco a alíquota final do IVA, me explicou Bernard Appy, o secretário extraordinário
da reforma tributária do Ministério da Fazenda. Ele me disse que a forma como o IVA é cobrado
deve reduzir a sonegação da tributação Sobre consumo.
Se isso de fato ocorrer, a alíquota do novo
imposto poderá ser menor. Muito provavelmente a alíquota média ponderada
depois da reforma vai ser menor que a atual. Por quê? Porque na verdade a reforma fecha espaço
para sonegação, inadimplência e elisão Fiscal, e isso tudo tem um efeito positivo
de reduzir alíquota quando o objetivo é Manter a carga tributária. Então, assim, alíquota padrão mais alta
do mundo é a que nós temos hoje. A que vai sair da reforma ainda vai depender
da regulamentação e vai depender de fato De qual vai ser o grau de redução de sonegação
e inadimplência. A gente tá confiante que vai ser relevante,
mas não consigo quantificar com precisão. E pode ser até que a gente tenha uma boa
surpresa nesse processo, que a gente descubra Que ela (a alíquota do futuro IVA) é menor
do que a gente estava estimando com base nas Hipóteses que nós estamos adotando hoje. A reforma prevê que em 2026 haverá uma fase
de testes do novo IVA, com uma alíquota simbólica, Justamente para saber como o imposto vai funcionar
na prática em termos de arrecadação e de Queda da sonegação. Com isso, será possível definir a alíquota do novo imposto. Agora vamos entender como a reforma dos impostos
sobre consumo pode alavancar o crescimento econômico. Em um artigo recente sobre a reforma tributária,
o economista Manoel Pires, da FGV, ressalta Que estudos já comprovaram o bom desempenho
do IVA em outros países. No caso de Canadá e China, por exemplo, a
adoção desse tipo de tributação sobre Consumo provocou aumento de investimentos,
vendas, geração de empregos e ganhos de produtividade. Segundo Pires, esses efeitos positivos têm
relação com a simplicidade do sistema e Com o fato do IVA gerar créditos tributários
ao longo da cadeia de produção, evitando O acúmulo de taxação. Ou seja, quando uma empresa compra um insumo
de outra, o IVA incide sobre essa operação. Mas, depois, essa empresa pode descontar o
que pagou de tributo na compra do insumo do IVA que será pago na venda do seu produto. Esses descontos são o que se chama de créditos
tributários. O sistema brasileiro hoje também tem geração
de crédito tributários em algumas operações, Mas a complexidade do sistema gera distorções
e disputas jurídicas. Além disso, também aumenta os custos das
empresas com burocracia. Segundo especialistas, esse conjunto encarece
o investimento no país e torna nossas exportações Menos competitivas.
Mudar essa realidade com o IVA deve alavancar
o crescimento, segundo estimativas preliminares De diferentes economistas. Uma projeção feita em 2020 por Bráulio
Borges, também pesquisador da FGV, estimou Que a adoção do IVA poderia elevar o PIB
potencial brasileiro em 20% em 15 anos. Já simulações de Edson Domingues e Débora
Freire, professores da UFMG, projetaram um Ganho um pouco menor, de 12% no mesmo período. Estudos mostram ainda que a reforma tributária
deve aumentar o poder de consumo da população, Em especial dos mais pobres. Isso porque a proposta em tramitação no
Congresso prevê a criação de um sistema De devolução de impostos para os brasileiros
de menor renda, algo que já é adotado em Outros países que usam o IVA, como Uruguai,
Colômbia e Canadá. Melina Rocha ressalta, porém, que os ganhos
esperados com a implementação da reforma Tributária levarão tempo, já que o novo
sistema só vai ser implementado completamente em 2033. Espero que esse vídeo tenha ajudado você
a entender melhor a polêmica do maior IVA do mundo. Continue acompanhando nossa cobertura no nosso
site bbcbrasil.com e nas redes sociais. Obrigada pela audiência e até a próxima.