Como vivem os brasileiros que escolheram ficar na Ucrânia
Desde que a guerra começou, há um
ano, milhares de pessoas deixaram A Ucrânia às pressas. Entre elas, muitos
estrangeiros que voltaram para seus países. No caso dos brasileiros, o Ministério das
Relações Exteriores registrava mais de 500 Morando na Ucrânia até 24 de fevereiro de
2022, quando a Rússia iniciou a invasão. Hoje restariam apenas 20,
segundo a Embaixada do Brasil. Eu conversei com alguns dos
brasileiros que, apesar dos riscos, Decidiram ficar. E com outros que
chegaram no país já durante a guerra. O padre Lucas Perozzi Jorge é de Presidente
Prudente, no interior de São Paulo. Ele mora há 19 anos na Ucrânia, onde
frequentou o seminário e foi ordenado. Quando a guerra estourou, saiu
da cidade onde vivia, Uzhhorod, Perto da fronteira com a Eslováquia,
e se mudou para a capital Kiev. "Eu não sabia se era uma loucura
minha ou uma missão mesmo que eu Deveria estar
aqui" O padre conta que a Igreja no Brasil e o próprio
Ministério das Relações Exteriores entraram em Contato com ele algumas vezes oferecendo ajuda
para que voltasse ao Brasil. Mas ele sempre negou. Hoje ele vive nas dependências da sua
paróquia. De lá, já viu vários ataques aéreos. "No início, era bombardeio todos os dias,
bombardeios com mísseis duas ou três vezes Ao dia. E sem contar que o Exército russo
estava ao redor da cidade, aos redores de Kiev. Depois da Páscoa começou a ficar mais
tranquilo, porque o Exército russo saiu, Voltaram. Então nosso problema até
agora são os ataques aéreos por mísseis” O padre Lucas me contou sobre
o episódio mais assustador. Logo em seus primeiros meses em Kiev, Um míssil atingiu um edifício que ficava
a menos de 1 quilômetro de onde ele vive. “E o choque também é forte. Daqui da nossa igreja, Nós sentimos os vidros tremerem
e a terra tremer também” Ele conta que hoje as sirenes de alerta, Acionadas sempre que há ameaça de ataques
aéreos, não causam mais pânico como no início. E que, apesar da orientação
das autoridades para buscar Refúgio subterrâneo sempre que o sinal soa,
muitos simplesmente seguem com suas vidas. “Tem Que levar em conta que a sirene toca
no mínimo uma ou duas vezes por dia, Pelo menos. Não toca simplesmente quando estão
chegando os mísseis, senão não dá tempo.” “Estamos levando uma vida normal para nós, que
para nós já é normal isso né? Mas que ao mesmo Tempo não é normal, todo mundo tá funcionando
do jeito que pode, na medida do possível”
Uma aparente sensação de normalidade em meio
a tudo isso também está presente nos relatos De outros brasileiros com quem eu conversei.
Olha só o que me disse a Aline Vittorazzo. “Eu vejo que as pessoas hoje em dia
já não se assustam como no começo. No começo tocava uma sirene e
as pessoas já saíam correndo, Já era aquele desespero. Hoje toca daí
dependendo do lugar as pessoas vão se Esconder mais tranquilo, tem gente que não
se esconde. Está virando um pouco de hábito” A Aline é de Curitiba, no Paraná,
e se mudou para a Ucrânia em 2020 Para acompanhar o marido Fabrício,
que é jogador de futebol e atua no Time Rukh Lviv, da cidade de Lviv, que
fica perto da fronteira com a Polônia. Após o anúncio da invasão, em fevereiro de 2022, O casal fugiu às pressas com a
filha de 2 anos, pela fronteira. Ela contou que o caminho foi difícil
– tiveram que atravessar uma grande Parte a pé e com uma multidão que
também tentava sair da Ucrânia. Foram 16 quilômetros levando malas,
carrinho de bebê e um cachorro. Fabrício estava lesionado, caminhando com muletas. Por isso, ela teve que carregar grande parte
das coisas sozinha. Eles chegaram na Polônia e, Semanas depois, voltaram para o Brasil. Mas em agosto, o time de Fabrício convocou
seus jogadores a se apresentarem em Lviv. E a família tomou a decisão de retornar à Ucrânia. 25:04 – 25:18 “A gente não
se separa, é uma família, A gente pensa dessa forma. Sempre
foi assim, quando saímos do Brasil, Fomos para outro país, e depois veio para
cá também. Então a gente sempre estava junto O clube dá muita segurança para a gente aqui, Muito apoio. Por isso que a gente acabou
voltando mesmo, pelo contrato de trabalho dele” Seguro, seguro a gente sabe que não é. Existe
o risco, né? Isso a gente tem consciência. Mas em comparação com outras cidades
que têm ataques muito constantes, Então aqui teoricamente ainda
é mais vantajoso de estar Aline conta que a maior dificuldade
hoje em Lviv são os apagões. Há meses, as forças russas têm atacado pontos
críticos para a infraestrutura ucraniana, Provocando cortes de água e energia no país. Aqui eu já presenciei ataque, por sinal aqui
perto de onde eu moro, como umas 8 ou 10 quadras, Tem uma central ali de energia. E teve
dois mísseis que caíram aqui perto Dá um susto, um impacto muito forte.
Na hora você fica com muito medo Esses ataques e a falta de energia
trazem ainda dificuldades para cozinhar,
Manter alimentos refrigerados e,
principalmente, aquecer a casa. Agora é inverno aqui na Europa. E em Lviv,
é normal ter temperaturas abaixo de zero. “Ontem a gente estava com luz, hoje
estamos com luz. Mas a gente estava Em uma fase de diariamente ter luz
duas, três ou quatro horas por dia. Aqui em casa eu ligo a calefação no máximo, Fecho tudo e fica quente para caramba. Aí
quando corta a energia consigo manter o Apartamento quente com a própria calefação
que eu já tinha ligado aqui dentro" Mas apesar de tudo isso, Aline e a família
pretendem continuar na Ucrânia por enquanto. “Essa é a realidade. Mas a
gente meio que se acostuma” Mas será que existe normalidade em meio a uma Guerra que já deixou mais de 7 mil
civis mortos e quase 12 mil feridos? Para o baiano Rodrigo Mota, que se mudou para A Ucrânia em junho para trabalhar na
resposta humanitária ao conflito, não. "Isso aqui devia… Todo mundo deve saber que
isso aqui não é normal, não deve ser normal e Que ainda que as pessoas estejam passando por
essa situação há quase um ano ou há um ano, Ninguém se acostuma com sirenes,
ninguém que se acostuma com bombardeios” "Eu passo todos os dias me lembrando de que isso
que não é normal e que não dá para ter uma vida Normal quando 18 milhões de pessoas estão passando
necessidade e precisando de ajuda humanitária” Rodrigo trabalha para o Programa
Mundial de Alimentos das Nações Unidas como assessor especial. Ele
mora em Kiev, mas precisa viajar Com frequência para outras zonas do país,
inclusive as mais atingidas pela guerra. “Eu costumo fazer bastante viagens por conta
do meu trabalho, então eu acompanho o nosso Diretor em viagens a lugares muito próximos
das fronteiras. E o que é mais interessante é Que nesses lugares a gente encontra as pessoas
que mais precisam né? Porque elas infelizmente Não conseguiram deixar o país, não conseguiram
deixar as suas casas. Então são nesses lugares Que a gente encontra as pessoas que estão
sofrendo a catástrofe da guerra do ponto de Vista humanitário, não tem acesso a outros meios
que não sejam os que a gente está provendo. Então Ajuda alimentar que a nossa organização é prover
ajuda com itens médicos de higiene e tudo mais" O Rodrigo me contou algumas das cenas mais Difíceis que ele presenciou. Elas
aconteceram na cidade de Kherson, Retomada pela Ucrânia em novembro passado
após oito meses de ocupação russa. A cidade foi deixada sem água, luz ou
qualquer tipo de comunicação. Minas Foram instaladas em áreas importantes
e muitos edifícios destruídos por Bombardeios durante a luta entre os dois lados.
“A gente chegou na cidade dois dias depois (que
ela foi retomada), então o cenário que a gente Encontrou foi um cenário de muita destruição. O
que obviamente afeta o psicológico de qualquer Pessoa que está ali, seja temporariamente, como
nosso caso, quanto os próprios residentes." Como me disse o Rodrigo, existem cerca
de 18 milhões de pessoas em necessidade De ajuda humanitária ou proteção
hoje na Ucrânia. Pra ter uma ideia, Isso representa 40% da população do país. E, infelizmente, não há indícios de
que a guerra vá terminar tão cedo. O Ministério das Relações Exteriores me disse que Não recomenda a permanência
de brasileiros na Ucrânia. Eles me mandaram uma nota dizendo que os cidadãos
que optem por ficar no país devem respeitar as Regras locais e seguir as recomendações
de segurança das autoridades ucranianas. O Itamaraty também pede que todos os
brasileiros na Ucrânia se cadastrem Na Embaixada e entrem em contato em
caso de necessidade de assistência. A gente, da BBC News Brasil, vai continuar
acompanhando os desenvolvimentos da guerra. Fica de olho no nosso canal no YouTube,
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nosso site, o bbcbrasil.com. Obrigada e até a próxima.