Como Japão foi de passado imperialista a nação pacifista
O Japão já foi um país imperialista,
protagonista de colonizações violentas E ações militares agressivas. Mas faz
80 anos que o Japão é regido por uma Constituição que renuncia à guerra.
Como aconteceu essa transformação? Eu sou Julia Braun, da BBC News Brasil, e nesse
vídeo conto um pouco da trajetória do Japão – de Seu passado imperialista até hoje, passando pela
Segunda Guerra Mundial, que mudou tudo por lá. O assunto voltou à tona com o aumento das
tensões globais por causa da guerra na Ucrânia. E Localmente, pelo temor dos japoneses do que China
e Coreia do Norte podem fazer militarmente. Tudo isso aqueceu o debate sobre uma reforma
na Constituição, e o primeiro-ministro Fumio Kishida vêm demostrando apoio à
expansão das Forças Armadas. Mas para entender tudo isso, precisamos vamos
voltar até o final do século 19, quando o país Enfrentou profundas transformações
políticas, econômicas e sociais. O Japão tinha passado 700 anos mergulhado em
um regime feudal dominado pela presença dos Militares no poder, até que um golpe de Estado
em 1896 deu início à chamada Era Meiji Nesse período, o imperador se aproximou
dos países capitalistas do Ocidente, Alçando seu país ao status
de potência mundial. Em busca de novos mercados consumidores e
matérias-primas, o governo japonês também passou A usar as guerras como meio para conquistar
territórios de outros países do Oriente. O professor de Relações Internacionais
Alexandre Uehara me explicou que o País foi muito influenciado por
potências imperialistas da época, Como Inglaterra, França, EUA e Alemanha,
em seu modo de fazer política externa. SOBE SOM “Especialmente no período entre
a 1ª e 2 ª Guerra Mundial, O país teve ações militares muito
agressivas, mas que de certa forma São semelhantes às empregadas pelos países
europeus na África e em outras regiões.” Nesse período de expansão imperialista, o Japão
ocupou a Coreia e conquistou territórios como A Ilha de Formosa, atual Taiwan, e a
Manchúria, no nordeste da China. Mas tudo isso aconteceu
com bastante violência. Um dos episódios mais marcantes ficou conhecido
como o Massacre de Nanquim. Foi quando, Em dezembro de 1937, as tropas japonesas
invadiram a cidade chinesa de Nanquim e Protagonizaram cenas bárbaras. A China diz
que mais de 300 mil pessoas foram mortas. Mas depois da 1ª Guerra Mundial a relação do
com as potências ocidentais começou a mudar. O crescimento econômico japonês e
seu governo militarista passaram a Ser percebidos como uma ameaça e o país
se tornou vítima de diversas restrições, Especialmente de acesso ao mercado de petróleo.
Foi nesse contexto que, em 1936, o Japão
firmou uma aliança com a Alemanha nazista E passou a integrar o Eixo, junto com alemães
e italianos, na Segunda Guerra Mundial. Uma das crueldades mais documentadas
do imperialismo japonês naquela época Foi com as chamadas “mulheres de conforto”. Estou falando de 200 mil jovens coreanas ou de
outros países da Ásia que foram obrigadas a atuar Como escravas sexuais para soldados japoneses,
em bordéis militares durante a guerra. Em 2007, Tóquio ofereceu desculpas oficiais
à Coreia do Sul e assinou um acordo com o País para indenizar as famílias e vítimas. Mas muitas das mulheres que ainda estão vivas, Assim como organizações de direitos humanos e
ativistas da causa, insistem que a compensação Financeira não foi suficiente e ainda
guardam rancor pelas ações japonesas. E até mesmo a relação entre os governos
em Tóquio e Seul permanece delicada. Mas o imperialismo japonês daquela época foi muito
além – e acabou determinando o futuro do país. Quando a França caiu nas mãos dos nazistas, Em 1940, o Japão se movimentou para ocupar
a Indochina francesa. Nos anos seguintes, Avançou sua ocupação para países como
Filipinas, Birmânia (que hoje é Mianmar) E Malásia. Junto vieram os enfrentamentos com
os Estados Unidos na região do Pacífico. Os militares japoneses acreditavam que, Se conseguissem neutralizar a frota
americana no Pacífico, teriam espaço Livre para conquistar mais territórios no
leste da Ásia e nas ilhas da região. O resultado você já deve imaginar qual foi:
o ataque surpresa à base naval americana de Pearl Harbor, no Havaí, em 1941, que
acabou levando a uma declaração de Guerra dos Estados Unidos contra o Japão e aos
ataques nucleares contra Hiroshima e Nagasaki. O fim da 2ª Guerra deu início
a uma nova era para o Japão. Após o lançamento das bombas atômicas
que arrasaram Hiroshima e Nagasaki, O país se rendeu, foi ocupado por
tropas americanas e obrigado a Aceitar os termos impostos
pelos Estados Unidos. Um dos grandes desafios do período era a
reconstrução da infraestrutura e economia. Fez Parte desse processo também a redação de uma nova
Constituição, supervisionada pelos americanos. O documento procurou eliminar qualquer
possibilidade de remilitarização ofensiva Do país, expressando literalmente, em seu
Artigo 9, que "nenhuma força terrestre, Marítima ou aérea será mantida no futuro,
nem qualquer outro potencial bélico", E renunciando explicitamente
à guerra "para sempre". O professor Alexandre Uehara explica
que ao mesmo tempo em que a Constituição
Pacifista foi imposta pelos EUA, um
aspecto cultural, típico asiático, Também foi importante nesse período. É o fato de
que, ao invés de guardar rancor após a derrota, O governo do Japão reconheceu sua derrota
e a superioridade militar ocidental. Mas o especialista também afirma que foi, Entre aspas, “conveniente para o
Japão ficar sob a proteção dos EUA, Para se manter afastado de conflitos e
investir em sua recuperação econômica.” David Boling, diretor de Japão
da consultoria Eurasia Group, Explica à BBC que a experiência da 2ª Guerra
Mundial foi tão ruim para o Japão que muitos De seus cidadãos concluíram que a
guerra, em geral, é um desastre e, Por isso, o país desenvolveu uma tendência
pacifista nas últimas oito décadas. Mas ao longo dos anos esse pacifismo
foi sendo reinterpretado e adaptado às mudanças do contexto internacional. Exemplo disso foi a criação da Tropas de
Auto-Defesa, que seriam a versão japonesa De um exército, em resposta à Guerra da
Coreia e ao início da Guerra Fria. Outra grande mudança nesse
sentido ocorreu em 2015, Quando entrou em vigor uma lei para
reinterpretar o artigo 9 e estabelecer Basicamente que as Tropas de Autodefesa
poderiam usar a força em nome de outras Nações se isso se provar necessário para
a segurança e sobrevivência do Japão. Em seus discursos, o então premiê Shinzo Abe
se referia à sua estratégia de diplomacia e Segurança nacional como “pacifismo proativo”. Mas há quem questione o uso da expressão diante Das mudanças e reinterpretações
adotadas ao longo dos anos. O professor Christopher Hughes, da
Universidade de Warwick, por exemplo, Defende que o Japão não é um país pacifista. Ele cita o fato de o país ter o terceiro
ou quarto maior orçamento militar do mundo, Buscar de capacidades de contra-ataque, possuir
a maior frota de caças F-35 depois dos EUA, Ter o direito de participar de
operações coletivas de autodefesa E manter uma ciberdefesa proativa como
argumentos para defender sua tese. A participação do Japão no Quad, ou
Diálogo de Segurança Quadrilateral, Uma aliança composta também pelos Estados Unidos,
Índia e Austrália em oposição à China, também é Apontada por críticos como uma postura atípica
para um país que se diz totalmente pacifista. Atualmente o Japão está mais uma vez em
um ponto decisivo, diante de desafios Sem precedentes, que fizeram emergir um medo de
virar alvo de ataque dos países vizinhos. A China gasta bilhões de dólares
em seu Exército e faz movimentos
Cada vez mais ousados no Mar do Sul da
China. A Coreia do Norte expandiu suas Ambições nucleares de modo mais alarmante no
último ano. E a invasão russa da Ucrânia e a Possibilidade de que Moscou use armas
nucleares também despertam temores. Por isso desde que chegou ao poder no ano passado, O premiê Fumio Kishida tem se engajado ainda mais
nas discussões sobre uma reforma do artigo 9. Mas segundo especalistas consultados pela BBC, A ideia não é abandonar o pacifismo
de vez, mas sim reinterpretá-lo. O professor James Brown, da Universidade
Temple, no Japão, definiu dessa forma: “Se já significou oposição ao uso de forças
armadas, hoje significa oposição à agressão e Aceitação do uso da força em nome da autodefesa,
em uma lista crescente de circunstâncias” Com isso eu fico por aqui. Siga conosco no
YouTube, nas redes sociais e em bbcbrasil.com. Obrigada e até a próxima.