Bolsonaro sem foro: os casos que podem ir para Justiça comum
Com a saída da presidência, Jair
Bolsonaro deixa de ter foro privilegiado. Ou seja, casos contra ele não vão mais
direto para o Supremo Tribunal Federal, Como acontece com presidentes
e algumas outras autoridades. Sou Julia Braun, da BBC News Brasil,
e neste vídeo eu explico quais são as Acusações a que Bolsonaro pode passar
a ter que responder na Justiça comum. Vou separar esses casos em quatro blocos: O primeiro, sobre os inquéritos que foram
abertos no STF durante seu tempo na Presidência. O segundo, resumindo as acusações feitas
no relatório final da CPI da Covid. O terceiro, com as acusações de crimes eleitorais. E, para terminar, um processo antigo contra Bolsonaro – aquele sobre ataques à
deputada petista Maria do Rosário. Começo então pelos inquéritos
no Supremo. São quatro. O primeiro é o das notícias falsas sobre
a vacina, aberto a pedido da CPI da Covid. O pedido de inquérito foi feito
após Bolsonaro ler numa live, Em 21 de outubro de 2021, uma notícia falsa
que ligava a vacina da covid ao desenvolvimento Da Aids em pacientes. Ele também citou
notícias falsas sobre uso de máscaras. O caso foi investigado pela Polícia Federal
sob supervisão do Supremo. A PF concluiu que As ações de Bolsonaro se enquadram no crime
de incitação pública à prática de crime. Em entrevista à Jovem Pan, Bolsonaro
se justificou dizendo o seguinte: Em agosto, o ministro do STF Alexandre de Moraes,
relator do caso, enviou o pedido de indiciamento De Bolsonaro ao Procurador-Geral da República,
Augusto Aras. Mas Aras nunca apresentou denúncia. O procurador-geral é visto como
aliado de Bolsonaro e acusado de Beneficiá-lo ao não abrir investigações
ou denúncias contra ele. Aras nega isso. Mas sem o foro privilegiado, o caso deixa
de ser competência da Procuradoria-Geral e Passa para o Ministério Público Federal, que
pode enviar uma denúncia à Justiça Federal. No segundo caso no STF, Bolsonaro foi incluído,
em meados de 2021, pelo ministro Alexandre de Moraes no chamado "inquérito das fake news",
que já tramitava no Supremo desde 2019. É uma investigação sobre notícias falsas, Falsas comunicações de crimes e ameaças
contra os ministros do Supremo, que está Ligada a um outro inquérito sobre atuação de
milícias digitais para atacar a democracia. A Justiça Eleitoral pediu a inclusão de
Bolsonaro após ele divulgar, numa live, Notícias falsas que questionavam a
confiabilidade do processo eleitoral. Na época, Bolsonaro reagiu,
também em entrevista à Jovem Pan: Apesar de ter algumas decisões
divulgadas de tempos em tempos,
O inquérito é sigiloso e tramita
no Supremo em segredo de Justiça. Por ter se originado a pedido do STF, o
caso deve continuar tramitando na corte. Agora o terceiro caso no Supremo, Um desmembramento do inquérito das fake news. Em agosto de 2021, Bolsonaro publicou nas
redes sociais uma série de links em que Falava de supostos problemas no sistema eleitoral. Os links continham documentos que fazem parte
de um inquérito sigiloso da Polícia Federal Sobre ataque hacker ao sistema do TSE em 2018,
ano em que Bolsonaro foi eleito presidente. Bolsonaro disse o seguinte na postagem: "Conforme prometido em entrevista
ao programa 'Pingos nos Is' [da Jovem Pan] segue os documentos que
comprovam, segundo o próprio TSE, Que o sistema eleitoral brasileiro
foi invadido e, portanto, é violável" Junto, colocou quatro links para documentos
vazados. O TSE informou na época que a tentativa De ataque hacker não representou qualquer
risco à integridade da eleição de 2018. E Bolsonaro acabou acusado de divulgar
dados de uma investigação sigilosa. Em janeiro de 2022, a Advocacia-Geral
da União afirmou, ao defender Bolsonaro, Que a investigação não estava sob sigilo
quando ele compartilhou os documentos. Mas em fevereiro, a delegada da Polícia Federal
que comanda a investigação enviou um relatório Ao STF com a conclusão de que Bolsonaro
cometeu crime de violação de sigilo funcional. Por causa do foro privilegiado, Bolsonaro
acabou não sendo denunciado. Isso precisaria Ser feito pela Procuradoria-Geral da
República. Mas a vice-procuradora-geral, Lindôra Araújo, pediu o arquivamento do inquérito. O pedido foi negado pelo
ministro Alexandre de Moraes, Que argumentou que a Procuradoria-Geral não
tem poder para impedir o prosseguimento de Uma investigação que não foi
requisitada por ela mesma. Uma vez sem o foro, Bolsonaro
pode ser indiciado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público,
respondendo pelo processo na Justiça Comum. Agora o último dos casos no STF, sobre
suposta interferência na Polícia Federal. A investigação foi aberta após denúncias do Ex-ministro da Justiça de Bolsonaro
e agora senador eleito Sergio Moro. Ao deixar o governo em 2020, Moro afirmou
que Bolsonaro fez tentativas de interferir Indevidamente na atuação da
Polícia Federal – querendo, Por exemplo, ter acesso a
relatórios de inteligência. Bolsonaro sempre negou qualquer interferência.
Ao responder pergunta sobre o tema
em entrevista ao Jornal Nacional, Da TV Globo, durante as eleições, ele
citou a divulgação das gravações da Reunião ministerial de abril de 2020,
que acabou famosa por causa do caso. Bolsonaro disse que, segundo Moro, a prova
da interferência estava na gravação. Mas que, Após a divulgação, "não acharam nada". Na
reunião, com a presença de vários ministros, Inclusive Moro, Bolsonaro reclamou “de
falta de informações da Polícia Federal". Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança Na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! As falas de Bolsonaro na reunião foram
apontadas pelo ex-ministro Sergio Moro Como prova de que ex-presidente tentou
interferir na autonomia da Polícia Federal. No fim, a Procuradoria-Geral
afirmou que não existem provas Suficientes contra Bolsonaro e
pediu o arquivamento do caso. Mas o inquérito ainda está em tramitação e, Se não for arquivado, também
pode passar para a Justiça Comum. Esses quatro inquéritos no STF
foram o primeiro ponto do vídeo. Agora, vamos ao segundo: as conclusões
do relatório final da CPI da Covid. As acusações contra Bolsonaro passaram para
apuração da Procuradoria-Geral da República, Que não apresentou nenhuma denúncia. O órgão pediu arquivamento em oito das 10 das
apurações preliminares. Entre elas, estão: – Acusação de ter causado epidemia com resultado
morte (por suspeita de ajudar a propagar o vírus); – De ter praticado charlatanismo (por Incentivar o uso de medicamentos
sem eficácia, como a cloroquina); – Ter cometido infração de
medida sanitária preventiva (por realizar aglomerações e não usar máscara); – Ter feito uso irregular de verbas públicas (por uso de recursos públicos na
compra de medicamentos ineficazes) – E, de ter cometido prevaricação (por
supostamente não ter mandado investigar Denúncias de corrupção na compra de vacinas). Na época da divulgação do relatório da
CPI, Bolsonaro afirmou que a comissão Não fez nada "produtivo" e gerou apenas "ódio
e rancor". Disse ainda que não tinha "culpa de Absolutamente nada" e que o governo fez "a coisa
certa desde o primeiro momento" da pandemia. Por enquanto, o Supremo não acolheu o pedido
da PGR para arquivar as investigações. Se Tivesse arquivado, as apurações só poderiam
ser reabertas se houvesse novas provas.
Com a perda do foro, o Supremo decidirá
se envia as investigações relacionadas A Bolsonaro para análise na Justiça comum. Mas é possível que as apurações fiquem no STF, Se envolverem outros investigados
que ainda possuem foro privilegiado. Se o caso for para a Justiça comum, caberá
a um procurador decidir se oferece denúncia E a um juiz de primeiro grau a decisão sobre
se abre ou não ações penais contra Bolsonaro. Agora, o terceiro ponto do vídeo:
os casos na Justiça Eleitoral. Bolsonaro responde a doze ações no
TSE por suspeita de crimes contra O sistema eleitoral. Se for condenado em
qualquer uma delas, ele fica inelegível. Com a perda do foro, é possível que
essas ações sejam enviadas aos Tribunais Regionais Eleitorais dos locais onde os
supostos crimes teriam sido cometidos. Mas também é possível que a Justiça
entenda que algumas das ações fiquem No TSE. Isso não por causa do foro de
Bolsonaro, mas pela natureza dos crimes. Uma das acusações é de abuso de poder político
e uso indevido dos meios de comunicação ao fazer Um evento para embaixadores estrangeiros
no Palácio da Alvorada em julho de 2022. No evento, transmitido pela
TV Brasil, a emissora pública, Bolsonaro fez ataques ao sistema eleitoral
e a autoridades do Poder Judiciário. Na época, a Presidência da República disse que o Objetivo do encontro era um "intercâmbio
de ideias sobre o processo eleitoral". Segundo o PL, partido de Bolsonaro,
foi uma reunião de governo, E não de campanha. Por isso, não podia
ser considerada propaganda eleitoral. Pra terminar, o caso Maria do Rosário. Antes de virar presidente, Bolsonaro
já era réu em dois processos penais Por incitação ao crime de estupro e por
injúria contra a deputada federal do PT. Em dezembro de 2014, Bolsonaro
disse a Maria do Rosário: Ele foi condenado a pagar indenização e
pedir desculpas no processo por injúria, Mas a ação penal por incitação ao
estupro foi paralisada em 2019 por Causa da eleição de Bolsonaro à presidência. Isso porque, pela lei, um presidente da
República não pode ser responsabilizado, Durante o seu mandato, por atos
cometidos antes de se tornar presidente. Com a saída de Bolsonaro do Planalto, a
ação volta a correr na Justiça. Ele pode Ser condenado a detenção de três a seis meses
– pena que costuma ser convertida em multa. Durante o processo, Bolsonaro e seus advogados
afirmaram que ele estava no exercício do Mandato parlamentar, e que a Constituição
assegura imunidade parlamentar nesses casos.
Com isso, eu fico por aqui. A gente da BBC News Brasil vai continuar
de olho no cenário político nacional. Obrigada pela audiência e até a próxima.