Bolsonaro furou teto de gastos em R$ 795 bi em 4 anos
Criado em 2016, para tentar segurar os
gastos públicos do governo brasileiro, O teto de gastos está cheio de furos.
Com despesas emergenciais para enfrentar A pandemia e aumento dos benefícios sociais
antes da eleição, a gestão Bolsonaro gastou R$ 795 bilhões acima do teto desde 2019, e esses
gastos começaram mesmo antes da covid-19. Agora, o presidente eleito,
Luiz Inácio Lula da Silva, Também quer aprovar no Congresso uma licença
para gastar acima do limite constitucional. Sua equipe de transição tenta liberar quase 200
bilhões de reais fora do teto apenas em 2023. Eu sou Mariana Schreiber, repórter da BBC News
Brasil em Brasília, e nesse vídeo te explico essa Questão em quatro pontos.
Primeiro, o que é o teto de gastos?
É uma regra na Constituição brasileira que limita O crescimento das despesas do governo federal à
inflação. Ou seja, se a inflação em um ano é de, Digamos, 5%, os gastos só podem subir nessa
proporção no ano seguinte. Ela foi adotada Em 2016 com o objetivo de evitar um descontrole
do endividamento do governo. Porque é assim.. Para cobrir gastos que vão além do que o
governo arrecada, o governo pega emprestado!
É normal que o setor público Tenha dívida, isso acontece em qualquer país.
Inclusive muitas vezes o governo contrai dívida Para continuar pagando juros da própria dívida.
E o endividamento público é medido em relação ao Tamanho da economia do país.
Atualmente, a dívida líquida pública brasileira
equivale a 58% do PIB, segundo o Banco Central, Bem acima do que era no final de 2013, quando
estava em 30% e passou a subir rapidamente. Veja como aumentou ao longo dessa última década.
O endividamento atual do setor público brasileiro, De 58% do PIB, também está elevado na comparação
internacional. Segundo estimativa do FMI, Países emergentes e de renda similar à do
Brasil têm hoje, em média, dívida pública Líquida equivalente a 41% do PIB. Países
ricos têm muitas vezes dívidas equivalente a Percentuais maiores do PIB, mas a grande diferença
é que essa dívida chega em melhores condições, Juros mais baixos por exemplo. Veja aqui os
percentuais em diferentes países do G20. Voltando a falar do teto de gastos no Brasil.
E o desejo de Lula é manter a prática De gastar acima do teto. Entrando no segundo ponto
do vídeo, vamos entender os planos do petista.
A proposta inicial feita pelo governo de Transição é que o Congresso libere até 198 bilhões
de reais acima do limite constitucional em 2023.
A maior parte disso, 175 bilhões de reais, Iria para o Auxílio Brasil, que vai voltar a se
chamar Bolsa Família. Outros 23 bilhões iriam para Investimentos em obras.
O benefício pago pelo Auxílio Brasil está em 600
reais, mas a proposta de Orçamento do governo
Bolsonaro prevê 105 bilhões de reais para o
programa em 2023, valor que garante um benefício Mensal de 405 reais a partir de janeiro.
A promessa de Lula é manter o valor de 600
reais, que era também a promessa de campanha De Bolsonaro, e passar a pagar mais 150 reais por
criança de até seis anos na família. Isso elevaria O gasto com o programa para 175 bilhões de reais.
Se o Congresso topar excluir esse montante do
teto, os R$ 105 bilhões que hoje estão previstos Pro benefício seriam remanejados para programas
como o Farmácia Popular, o Minha Casa Minha Vida E de merenda escolar.
Mas críticos dizem que tanto aumento de gastos
vai elevar a inflação e o endividamento público, Exigindo que o Banco Central suba mais a taxa
básica de juros do país, hoje em 13,75% ao ano. Isso acontece porque mais dinheiro na
economia, com esse aumento dos gastos, tende A elevar a inflação. É um ciclo: com gastos mais
descontrolados, os preços tendem a subir. Para Manter seu compromisso de manter a inflação sob
controle, o Banco Central eleva as taxas de juros Que servem como uma espécie de freio na inflação.
Juros altos tendem, por exemplo, a reduzir Empréstimos pela população e diminuir justamente
essa capacidade de consumir que normalmente eleva Preços. É por isso que mais endividamento
tem esse efeito de inflação e juros altos.
Voltando a Lula, Os gastos almejados pelo petista estão em uma
proposta de emenda à constituição, chamada de PEC da Transição. O desejo inicial do petista era
tirar o Bolsa Família do teto definitivamente, Mas o projeto protocolado no Senado prevê que isso ocorra por só 4 anos
Outra possibilidade em discussão é aprovar um furo menor no teto. O ex-ministro da
Economia Nelson Barbosa, que integra a equipe de Transição do governo eleito, por exemplo,
sugeriu uma licença de R$ 136 bilhões.
Segundo ele, Esse valor manteria o gasto do governo em
cerca de 19% do PIB, mesmo patamar deste ano.
No terceiro ponto do vídeo, vamos lembrar por Que o governo Bolsonaro gastou acima do limite
Eu pedi um levantamento ao economista Bráulio
Borges e o que vimos foi um furo gigantesco ao Teto de gastos: soma 794,9 bilhões de reais
entre 2019 e 2022. Ou seja, praticamente 200 Bilhões por ano.
Estou falando da soma de autorizações que o
governo Bolsonaro obteve no Congresso para Gastar acima do limite constitucional, junto com
outras manobras que driblaram o teto. Por exemplo, O adiamento do pagamento de precatórios, aquelas
dívidas do governo reconhecidas judicialmente.
A maior parte dos
Furos ocorreu em 2020, quando o Congresso liberou
amplamente as despesas devido à pandemia. Mas Teve furos no teto de gastos em todos os anos do
governo Bolsonaro, inclusive antes da pandemia.
Em 2019, o presidente primeiro defendeu A flexibilização da regra. Depois, encontrou
resistência do ministro Paulo Guedes e recuou, Dizendo que gastar acima do teto seria, entre
aspas, “uma rachadura em um transatlântico”.
Apesar disso, já em 2019 O governo "furou" o teto. Naquele ano, o Congresso
alterou a Constituição para permitir que o governo Transferisse para Estados e municípios cerca de R$
46 bilhões relativos à arrecadação com o leilão de Campos de petróleo.
Isso foi necessário porque apenas
as transferências obrigatórias para Governos estaduais e municipais ficam fora do
teto, o que não era o caso do compartilhamento Dessa arrecadação.
Ao retirar essa transferência do teto, o governo
liberou espaço para outras despesas que teriam Que ser cortadas.
O governo também registrou fora do limite 7,6
bilhões de reais injetados na estatal Emgepron, Para renovar a frota da Marinha.
No ano seguinte veio a pandemia, E o Congresso aprovou o chamado Orçamento
de Guerra, com recursos extras para saúde, Para evitar demissões nas empresas e para
compensar a perda de arrecadação de impostos Por Estados e municípios. E, é claro,
para o Auxílio Emergencial de 600 reais.
No ano seguinte, vieram novas ondas da covid, E mais despesas foram liberadas acima do teto.
Agora em 2022, o governo conseguiu que o
Congresso aprovasse a chamada PEC dos Precatórios, Com objetivo de abrir espaço no Orçamento para
manter o Auxílio Brasil em 400 reais neste ano.
A PEC trouxe duas medidas. Uma delas foi alterar o cálculo que reajusta
o teto pela inflação, manobra que permitiu ao Governo gastar neste ano 26 bilhões de reais a
mais do seria autorizado pela regra original.
Além disso, a PEC autorizou o atraso no Pagamento de precatórios, que são dívidas da União
com pessoas e empresas. Isso abriu uma folga de Mais 49 bilhões de reais no teto.
Depois, em julho deste ano, o Congresso aprovou o
que ficou conhecido como PEC Kamikaze, autorizando Uma série de benefícios como o aumento do Auxílio
Brasil de 400 para 600 reais e novos auxílios para Caminhoneiros e taxistas.
Foi preciso mudar a Constituição,
não só por causa do teto de gastos, Mas também para contornar a legislação
eleitoral, que impede que o governo crie
Benefícios às vésperas da eleição, pra não ter
vantagem que possa ser considerada desleal.
Bom, o governo disse que os gastos Fora do teto eram culpa da guerra na Ucrânia, que
mexeu com o suprimento global de comida e energia E fez subir a inflação no mundo.
Mas um detalhe importante: Bráulio Borges explica
que parte dos gastos acima do teto do governo Neste ano já tinham sido aprovados no final de
2021, antes de a guerra começar na Ucrânia. É Por isso que o economista acha que o objetivo
principal era ampliar programas sociais para Melhorar a avaliação do governo no ano eleitoral.
O ministro Paulo Guedes não respondeu
às críticas diretamente, mas disse, Na época, entre aspas: “se há fome no Brasil, se
as pessoas estão cozinhando à lenha, se isso tudo é verdade, esse programa não é eleitoreiro".
Bráulio Borges calcula que serão gastos R$ 41,2
bilhões acima do teto até o final deste ano, Devido à PEC Kamikaze. Somando isso ao atraso
dos precatórios e a mudança do cálculo do teto, O governo terá usado R$ 116,2 bilhões acima
do que a regra original permitiria para Este ano.
Eles (o governo Bolsonaro)
enfrentaram realmente um cenário bem adverso, não podemos ignorar isso Mas toda essa bagunça (nas contas públicas) que
a gente está discutindo pro ano que vem começou Com a PEC dos Precatórios no final de 2021, ela basicamente desmoralizou a regra do teto de gastos. Basicamente mudou a regra no meio do jogo Para viabilizar mais gastos no ano da eleição. E isso só piorou em 2022 com a chamada PEC Kamikaze, PEC dos benefícios
Para o pesquisador da FGV, a discussão
precisa avançar para uma nova regra fiscal Que substitua o teto, já que claramente
essa regra não está funcionando. O próprio Paulo Guedes já deu declarações dizendo que a regra do teto foi mal desenhada
Isso me leva ao último ponto. O que Deveria entrar no lugar do atual limite?
Alguns especialistas em contas públicas, como
Felipe Salto, defendem que o teto seja substituído Por uma regra que atrele o aumento de gastos
ao comportamento da dívida pública. Ou seja, Se o governo está mais endividado, tem
que restringir as despesas, e vice-versa.
O grupo Elas no Orçamento, Que reúne mulheres especialistas em finanças
pública, como a economista Monica de Bolle, Também elaborou uma proposta. Ela prevê uma meta
de endividamento público de médio prazo e um novo Teto de gastos com duração de quatro anos. Ou
seja, em vez do limite ser anual, valeria por Todo o mandato do presidente.
Durante a campanha eleitoral, Lula defendeu o
fim do teto de gastos, mas ainda não detalhou Uma proposta.
Você deve estar se perguntando que consequências
esses furos no teto podem ter para o presidente. Afinal, Dilma Rousseff sofreu impeachment
acusada de descumprir outras regras fiscais.
No caso dos furos no teto, isso Não ocorre porque o próprio Congresso autorizou
os gastos acima do limite constitucional. É Justamente esse aval que Lula busca agora.
Por outro lado, a depender do tamanho das Despesas liberadas, pode haver algum impacto entre
investidores do mercado financeiro no sentido E aumentar a desconfiança sobre a capacidade
do governo de pagar sua dívida, o que tende a Pressionar os juros do país para cima.
É isso, espero que esse vídeo tenha ajudado você
a compreender o debate sobre o teto de gastos. Até a próxima.